quarta-feira, agosto 06, 2003

Viagem de Metro. “Próxima estação: Roma”. Entrou. Óculos de sol a esconder maus-tratos. Olho inchado, ensanguentado. Que se vislumbra, de viés, mirando-lhe o perfil. Movimentos lentos de cabeça. Palavras sopradas a custo. Sibiladas. Os cantos da boca descaídos manifestando uma tristeza atordoada e a envolvente dos lábios inchada, sem jeito. Desloca o corpo com o mesmo torpor com que fala; melhor, sussurra. Traz vestida uma saia. Transparente. Muito. De bainha em viés, a terminar em folhos. A cintura descaída e a blusa subida escancaram o umbigo aos olhares. Por sobre a cintura, francamente acima do cós da saia, vê-se uma tanga pérola. Estreita, a subir das íntimas partes. A adivinhar-se suave. De seda. Vêem-se claramente as pernas. As formas. Sapatos de salto alto abertos. Com finas tiras a contornar o tornozelo. Efectivamente não cheira, mas parece que cheira. A sexo. Sexo pronto. Pronto a consumir e pronto. Saia de tiragem rápida. Fio dental que se arreda. Corpo que não resiste. Que se oferece. Que se vende. Que se usa e de que se abusa. Efectivamente só cheira a transpiração. A transpiração de um dia quente, certamente difícil. Certamente igual aos outros. As unhas dos dedos das mãos são maltratadas. Cortas ao limite. Com os dentes. Com malhas ordinárias de um verniz com que almejou tornar-se diferente. Lampejo fugaz da ténue esperança que a espaços se lhe acende alvitrando o possível regresso da felicidade que lê e que anseia para si. Que lê no romance de cordel que transporta consigo na mão direita. Enquanto a esquerda, sinistra, tomba no seu colo agora que se sentou. Abandonada. Abandonadas. Ela e a sua mão sinistra. Dum braço sinistro. Com as marcas evidentes das agulhas que lhe tecem a vida. Um braço frágil, que a aparta dos sonhos, fortemente apertado por uma cobra, em espiral, de prata. Símbolo da perfídia. Da tentação a que sucumbe. “Próxima estação: Intendente”. Saiu…