sexta-feira, julho 01, 2005

Carta Aberta ao António Pires de Lima [com quem até tenho vários pontos de convergência]
Entendamo-nos, caro Pires de Lima,

Um projecto político liberal tem, necessariamente, que ser um projecto laico; um projecto sem venerações, explícitas ou implícitas, a confissões religiosas.

Um projecto político liberal defende intransigentemente a liberdade do indivíduo e reduz a intervenção do Estado na esfera privada ao mínimo necessário. É um projecto que reconhece o direito à morte (eutanásia) a quem o queira reivindicar para si. É um projecto que reconhece o primado da razão e que, em matérias como a “vida”, admite, tolerantemente, “leituras e fronteiras” diferentes.

Um projecto político liberal é, essencialmente, um projecto de abertura ao outro e compadece-se pouco com princípios de controlo de fronteiras demasiado musculados.

E isto tudo sem embargo de um liberal poder ser profundamente religioso e de ser contra a prática do aborto e da eutanásia, mas o que não pode é, em coerência, e enquanto liberal, defender como ordem do Estado estas suas íntimas convicções; sob pena de deixar de ser liberal para passar a ser democrata-cristão ou outra coisa qualquer.

Ora, caro António Pires de Lima, o que tenho alguma dificuldade em compreender (o rui do Blasfémias, aparentemente, também…) é como é que um manifesto Liberal, como este, é compatível com uma tão recente condução dos destinos do CDS/PP aos valores mais gratos da direita que se cobre com a manta do Salazar*.

Terça-feira, dia 5, procurarei estar no Nicola para ouvir a resposta.

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* - E note que não me refiro, exactamente, à última campanha do CDS/PP. Mas a todo o período anterior a ela. Estou aliás em crer que quem votou CDS nas últimas eleições não foi exactamente quem havia votado nas eleições anteriores. E a razão disso está, iniludivelmente, no discurso permanentemente errático que o CDS tem tido e que, também por isso, não permite a consolidação de um eleitorado liberal.